Por Vanessa Henriques
Estação Consolação
Pediu licença e sentou-se ao meu lado. Eu estava distraída observando as pessoas que entravam no vagão, quando notei uma agitação. Do meu lado, uma moça anotava rapidamente algo em um caderno, como se não pudesse deixar para amanhã.
A curiosidade, minha antiga companheira, permitiu que eu desse uma espiadela. Era um diálogo, talvez um fragmento de uma conversa tida há pouco tempo. Senti uma empatia imediata.
Estação Trianon
O trem avançava, e as anotações também. Tentava disfarçar, mas não conseguia evitar. Não que ela tenha percebido ou se incomodado, afinal estava totalmente empenhada em sua tarefa. Finalmente consegui ver, de relance, alguns fragmentos:
Ela me disse:
— Tá tudo tão líquido.
(…)
— Onda é líquido, mas bate e foge.
Estação Brigadeiro
Apaixonei-me por aquele diálogo — ou talvez pelo pequeno fragmento que pude espiar. Pensei em falar com ela, dizer que também gostava de escrever e carregava comigo um caderninho para momentos de inspiração. Ofereceria minha ajuda para terminar esse diálogo à la Bauman.
Mas… o que eu estou falando? Eu detesto que se intrometam em meus textos, mais ainda quando estou tão inspirada! Nessa fase inicial então, quando o texto é apenas um zigoto que irá se multiplicar e se complexificar nos próximos segundos, seria um pecado. Teria que me contentar com o papel de espectadora.
Estação Paraíso
Inferno! Quero saber como isso termina!
Eis que ela virou a página. Não parecia a continuação daquele diálogo que não pude ler por inteiro, mas sim uma segunda tentativa. Uma música? Um poema? Os versos eram de fato mais curtos…
Não pude descobrir. O sinal avisava que esta viagem havia chegado ao fim. Busquei com o mesmo afã de minha colega o meu caderninho. Lembrei-me que o havia deixado em casa justo naquele dia. Abri, meio atrapalhada, o nunca antes utilizado bloco de notas do celular (horrível, caso estejam se perguntando). Anotei as ideias principais, com receio de esquecer o que tinha acabado de ver — mesmo sabendo que não esqueceria assim tão fácil. Sabem como é, as coisas andam meio líquidas…
Nunca saberemos o fim? Ou o começo? Quem sabe um dia, na livraria mais próxima.