Por Vanessa Henriques
Vocês devem ter percebido (digam que perceberam!!) que tenho tentado voltar ao ritmo de escrita desde que postei aquele vídeo do aniversário do blog. Este texto era para ter vindo logo na sequência, ou até antes, mas acabei me embolando sozinha com compromissos pré-férias e viagens. Eis que ele veio.
Todo mês de junho tem tom de dilema. Sempre lembro, lá pro meio do mês, que o blog completa X anos e meu deeeus eu preciso fazer algo sobre isso. Ou não preciso? – afinal, não posto faz meses. Ainda faz sentido manter o blog? Virou só obrigação (e, ainda por cima, obrigação não cumprida)?
Os anos passam e a dúvida continua. Embalada por algumas conversas da terapia, decidi dar mais uma chance para esse blog surrado. Entrei no painel do wordpress e comecei a reler comentários. Tinha bastante coisa boa ali: confissões profundas e engraçadas, pedidos por mais textos, ranking de identificação…
Tinham comentários emocionados sobre textos que eu nem lembrava de ter escrito. [Mari Kondo que me perdoe, mas avancei pro estágio proibido e comecei a ler os textos antigos no meio desse processo de quase-arrumação de casa.] Tinha coisa boa ali, agradável, que eu gostei de reler.
E quanto mais eu fuçava, menos motivos sobravam para deixar de postar aqui. Deu uma saudade de mim, de outros tempos de vida que eu já tinha me esquecido que existiram. Eu escrevia bonito. Eu escrevia poesia. Eu escrevia quase toda semana. Quanta coisa mudou.
Ninguém sabe apontar o momento certo que, opa, tudo mudou. É impossível. Mas sempre restam pistas. Durante esses seis anos de Croniquices, eu passei por quatro empregos, mudei de casa, viajei muito, fiz novos amigos, perdi alguns. Vivi também experiências que me fizeram questionar a minha escrita, algo que compartilhei com poucas pessoas.
No início de 2016 fui aceita no Clipe (curso de escrita de literária oferecido pela Casa das Rosas) e passei no trainee da Folha. Parecia que agora tudo ia deslanchar com relação à escrita, certo? Mas a verdade é que tudo isso me colocou numa baita insegurança.
No curso, eu não tinha uma escrita profunda, atropelada, cheia de metáforas, miniconto ou o quer que seja. Não tinha lido os clássicos e nem conhecia as promessas. Na Folha, eu não tinha o tino de repórter, o texto seco, desidratado de conjunções e de clichês. E eu não sabia o que eu tinha, pra melhorar a situação. Ao invés de aproveitar o que aprendi e me aprimorar, acabei ficando vazia depois dessas experiências. A canoa virou.
E escrever ficou cada vez mais difícil. Estava assombrada pela concorrência, desestimulada, perdida. Nem me dava mais ao trabalho de inserir um “escrever crônica” na minha lista semanal. Quando a inspiração vinha, eu batia um texto sem vontade e publicava, para cobrir os buracos de meses sem publicação.
Eis que depois de tudo isso, eu leio um texto lindo sobre a chuva:
“[a chuva] só queria cair do céu, aliviada depois de um dia abafado, penetrar na terra, quem sabe ir parar num lençol. Nós atrapalhamos também o caminho dela, mas ela não se vinga de nós. Continua caindo, incólume, sob nossas cabeças.
As andorinhas, ao contrário, dançam e brincam, recepcionando a chuva que decidiu cair impiedosa. Molham as penas sem dó, sem pensar no estrago do dia seguinte. Enquanto há chuva, há motivos para furá-la com voos rasantes.
Gosto de pensar que a chuva, assim como nós, tem humor. (…) Somos impermeáveis à água, mas permeáveis às sensações. Qual o humor da chuva de hoje?”
Fui eu que escrevi isso, lá nos idos de 2013. Nos últimos anos, não fui capaz de escrever nada nesta linha. Porque eu esqueci da chuva, perdi a habilidade de olhar para ela e acho tudo que foi escrito sobre a chuva é melhor do que eu possa fazer. Cronista impermeável não serve de nada.
E agora, o que resta? A lembrança de tempos melhores e um objetivo. Voltar para trás para ir em frente. Mais um ano para continuar tentando. Falemos em junho.